domingo, 27 de outubro de 2013

re-vez

Tem gente que come a casca da cebola?
Tem gente que dorme dentro do guarda-roupa?
Tem gente que vive em cima do guarda-chuva?
Tem gente que colhe a fruta que não está madura?
Quem é? Quem é? Eu vou buscar lá longe, eu vou!
 
No deserto, no rio, no inferno de ser o que sou.
Se diz não, se diz sim, eu atendo
Eu entendo se ele não voar
E tiver o nariz meio torto e o peito sem ar
Mas se o tempo leva dentro
O meu chronos e o kairós
Não há medo que sopre pra fora o que há de nós
Não há pedra que quebre o segredo da casca de noz.
 
Eu me rendo!
Não aguento!
Um segundo mais de vida 
no bico de tanto urubu
Destrinchando a carne que aberta
ainda vive
E que morre assistindo ao amor sangrar de dor.

sexta-feira, 18 de outubro de 2013

De raiz

Enfia a cara no sono
e prolonga um beijo
De olhos fechados não há
quem não tenha o desejo
De ter longas pernas que alcancem
lá longe e veja
O banho do vale lavando
os caminhos do medo

Dormindo se foge se encara
os tiros e o tempo
E olha no fundo da espera
pra dizer "te conheço!"
E acorda surpreso
por ter sua dor revelada
Cantarola no chuveiro
Como não fosse nada

De fora o passo é pequeno
não percebe as raízes
que nascem de noite ao relento
formando um rebento
Que bota de pé
A sede que sente a garganta
                           o peito
                           os vícios
Raiz que arrancamos do chão
ao calçar os sapatos

Vai, o vento da noite vai deixar você jogar
O corpo de lado, muda pequena pra plantar

Vai, a tempestade também quer ter seu lugar
Molhando os dedos e os medos que pode tocar.

quarta-feira, 9 de outubro de 2013

caixa de música

Brinca ao redor do peito
os passos da bailarina
Meu corpo é a sua pista
Na dança com os pares
Não dê na vista
bailando em círculos
Esse amor desmesurado
E não insista, apenas dance
Milhas e milhas
até o fim da corda.

Flor de junho

Aberto um botão
fechando na primeira casa
da camisa de força
Quem ousa brotar
Em meio ao caos e aos cães
Não sendo flor de copo d'água
ou buquê
Não é usada pra perfume
ou na TV
Uma flor nasceu na rua
quantas mais irão nascer?
O Carlos ali parado
concretizado na cena
E os cachorros se enfiando
pra cheirar os canteiros
Afundando suas patas
num embolado de espinhos
Eu sei, é feia, são feias, são tantas,
E haja cão, e haja caos
e haja mais o que eles quiserem.
Amanhã a cidade inteira vai cheirar flor.

exasas

um mosquito
é um sonho
com asas
fuça no lixo
mexe na bosta
mas vôa.

mas pra quem

Deus deu asas pra vuá
pro morcego
mosquito e sabiá.

na calada

Fina a telha da casa
por onde transpassa
a noite adentro
Espessas nuvens caindo
para ser o cobertor macio
belíssima estrela estilhaça
vai ser a preguiça
que espreguiça, brilhosa
E o escuro desce calado
no estralo assustado do armário
para ser o medo do menino
Denso, o sopro do vento noturno
balança as paredes que caem
no sono assoprado nos olhos
Areia calmante de todo-santo-dia
Por fim, quase já dia
o que cai do céu é um manto sereno
que adormece calado o pranto
que chora o corpo da vela.

azum

o mantra dos mosquitos
vai cantar
os meus zumbidos